
Freqüência da doença periodontal em gestantes com parto pré-termo
Artigo elaborado a partir da dissertação de Anna Cristina Araujo Ventura Moreno, intitulada: “Freqüência da doença periodontal em gestantes com parto pré-termo – Realizada no Serviço de assistência médica de Barueri, São Paulo”. Centro de Pós-Graduação / Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo Mandic, 2008.
Anna Cristina Araujo Ventura Moreno
Mestre em Periodontia
Especialista em Endodontia
Eduardo Saba-Chujfi
Professor Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Periodontia do C.P.O. São Leopoldo Mandic
RESUMO
Este estudo procurou verificar a prevalência da doença periodontal em um grupo de 180 gestantes brasileiras e a provável inter-relação com o nascimento de prematuros. Durante o pré-natal os dados anamnéticos e o exame periodontal das pacientes foi realizado. Após o parto as puérperas foram recontatadas e os dados do bebê e do parto coletados e analisados estatisticamente. Estes mostraram que, o parto pré-termo ocorreu em 10% dos casos sendo que, a doença periodontal aumentou em 3,2 vezes a chance de ocorrência de prematuridade após a eliminação das variáveis de controle. Os dados foram estatisticamente significativos, p<0,05, de forma que a alta prevalência da doença periodontal obtida demonstrou forte associação com o parto pré-termo nesta população.
Palavras-chave: periodontite crônica, prematuridade, parto pré-termo.
INTRODUÇÃO
O nascimento de bebês prematuros de baixo peso permanece como um importante problema de saúde pública, capaz de causar morte neonatal e distúrbios no desenvolvimento neural e ainda, problemas de saúde a longo prazo. Assim, este estudo propôe-se a investigar até que ponto a presença da reação inflamatória oriunda da doença periodontal (DP) em mulheres gestantes, pode interferir como fator de risco na ocorrência de partos pré-termo (PPT).
Valendo-se de variáveis dos tipos dependente e independente, segundo classificação e categorização pré-determinada, a amostra foi selecionada em um grupo de 180 gestantes brasileiras que fizeram acompanhamento pré-natal nas unidades básicas de saúde do Serviço de Assistência Médica de Barueri – SP, estimando-se a prevalência de partos a termo (PAT) e pré-termo na população estudada.
A verificação das condições do recém nascido na ocasião do nascimento foram inter-relacionadas com as condições bucais da mãe, no que se referem à saúde periodontal, durante a gestação. Sabemos que, em mais de 25% dos casos de prematuridade ocorridos atualmente a causa não é identificada e a prematuridade continua sendo a principal causa da mortalidade neonatal. Será a DP uma das possíveis causas?
MÉTODOS
Seleção das pacientes
Após aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa, duzentas pacientes, com gestações compreendidas entre 20 e 31 semanas, foram selecionadas aleatoriamente e examinadas imediatamente após a avaliação médica de pré-natal.
As pacientes eram encaminhadas pela médica da própria paciente, ao consultório odontológico da unidade no qual foram realizados esclarecimentos sobre a pesquisa, anamnese, exame periodontal, coleta de dados do cartão de pré-natal e assinatura do termo de consentimento. O estado de saúde periodontal encontrado foi informado à paciente.
Após a data provável do parto as pacientes foram contatadas, preferencialmente via telefone e em alguns casos na própria unidade de saúde durante o retorno para puericultura e os dados restantes do cartão pré-natal foram anotados assim como os dados contidos no resumo de alta. Para completar os dados não existentes na documentação foram feitas perguntas diretas à paciente.
Vinte casos foram perdidos, quer pela dificuldade de recontatar as pacientes, história de infecção grave ou porque a paciente procurou tratamento periodontal durante a gestação (4 casos) porém, a amostra proposta inicialmente de 180 pacientes, como segue abaixo, foi alcançada.
Tamanho da Amostra
O tamanho da amostra (n) foi baseado na prevalência de periodontite em partos pré-termos. Pereira (2006) encontrou 38,7% de PPT e uma prevalência de periodontite de 63,6% nos PPT e 35,1% nos PAT. Considerando-se os valores encontrados, um nível de significância (p) de 5% e um poder de teste de 80%, seriam necessários n=63 de casos de PPT (Pocock, 1987). Com base na prevalência encontrada (38,7%) serão necessários n=163 casos para que se tenha 63 casos prematuros. Como espera-se que haja uma perda de seguimento, suposta em 10%, resultou-se em n=180.
O estudo foi denominado do tipo coorte, pois as variáveis avaliadas durante o pré-natal foram acompanhadas após o parto para verificar a ocorrência de prematuridade.
CRITÉRIO DE INCLUSÃO
Gestantes voluntárias, saudáveis, com faixa etária entre ≥18 e ≤36 anos e com idade gestacional de ≥20 semanas (data da última menstruação – DUM), independente de ser primípara ou multigesta.
CRITÉRIO DE EXCLUSÃO
Foram excluídas gestantes com história de infecção grave durante a gravidez, assim como aquelas que realizaram tratamento periodontal após nossa avaliação. Quando não foi possível determinar a data da última menstruação, a gestante também foi excluída do estudo.
4.2.4 Variáveis sócio-demográficas e antecedentes
Idade, cor da pele, estado civil, escolaridade, tabagismo, uso de álcool, drogas ilícitas, Diabetes, Hipertensão, uso de antibióticos.
4.2.5 Características gestacionais
Data da última menstruação (DUM), gemelaridade na família, presença de patologia uterina, intercorrências obstétricas, infecção urinária na gestação, histórico de aborto, número de consultas de pré-natal, número de gestações (inclusa atual), trabalho de parto, ruptura de bolsa espontânea, tipo de parto, idade gestacional pelo Capurro e grupo: Parto a termo (≥ 37 semanas) ou PPT (<37 semanas), segundo a Organização Mundial da Saúde.
Exame Periodontal
Número de dentes presentes, número de sítios com perda de inserção clínica (PIC: sondagem tendo como referência a junção amelodentinária, estimando-se a perda de suporte periodontal), profundidade de sondagem (distância da margem gengival até a porção mais apical sondável), sangramento gengival, presença de biofilme por dente, presença de implante com mucosite ou perimplantite.
Os critérios acima avaliados levaram a distinção no diagnóstico das patologias periodontais, sendo: gengivite (quando notado apenas inflamação gengival) e periodontite (quando além da inflamação gengival observou-se perda de inserção periodontal). Estas foram então classificadas em: Gengivite localizada, Gengivite generalizada, Periodontite inicial (PIC ≤3 mm), Periodontite moderada (PIC >3mm ≤5mm), Periodontite grave (PIC >5mm). Quanto à extensão dos sítios comprometidos estas foram classificadas (Lindhe et al. 1999): localizada (≤ 30% dos sítios) ou generalizada (>30 % dos sítios).
A sondagem foi realizada em 6 sítios por dente, em todos os dentes com exceção dos terceiros molares que foram excluídos do estudo. Segundo Brunetti (2004) este método de boca-inteira é mais preciso, porque coleta dados de todos os sítios de um indivíduo. A presença de periodontite foi considerada positiva quando a PIC e o sangramento foram observados no mesmo sítio.
Para que houvesse uma padronização dos dados estes foram colhidos por uma única examinadora valendo-se de sondas periodontais Goldman Fox Willians, Hu-FriedyTM (1-10mm).
4.2.7 Análise Estatística
Inicialmente todas as variáveis foram estudadas de maneira descritiva, através do cálculo de freqüências absolutas (n) e relativas (%), e no caso das variáveis contínuas, através do cálculo de média, desvio-padrão, mediana, valores de mínimo e de máximo.
Para estudar a associação das variáveis categóricas com a variável resposta, estudou-se cada uma delas bivariadamente através do cálculo da RP (Razão de Prevalência) e seu respectivo intervalo de confiança, e do teste de qui-quadrado (ou exato de Fisher quando uma das caselas apresentou valor inferior a 5).
As diferenças de médias das variáveis contínuas entre os grupos PAT e PPT foram avaliadas através do teste de Mann-Whitney, pois a distribuição dos dados não passou pelo teste de aproximação à curva normal. Foi realizada a Regressão de COX Múltipla para cálculo a RP ajustada. O nível de significância foi assumido em 5% e o software utilizado para análise foi o SAS versão 8.2.
RESULTADOS
A amostra foi composta por 180 pacientes, com idade média de 24,8 ± 5,2 anos, sendo a maioria branca (55,5%), com companheiro (82,2%), baixo grau de escolaridade: fundamental / não alfabetizadas (47,8%) e médio (49,4%). O hábito de fumar foi relatado por 10,6% e nenhuma delas relatou uso de álcool. Patologias anteriores estavam ausentes na maioria (72,2%), sendo o relato mais freqüente o histórico de anemia (11,1%).
A ocorrência do PPT foi de 10% na população estudada. Sua prevalência foi maior nas pacientes com idade acima de 30 anos (15,6%), cor da pele não branca (13,6%), com companheiro (10,8%), escolaridade fundamental e não alfabetizadas (14,0%), não fumantes (10,6%), hipertensas (28,6%) e que fizeram uso de antibiótico durante a gestação (15,8%), sendo que os grupos não apresentaram diferença significativa entre as variáveis de controle sócio-demográficas (p > 0,05 e RP c/ Intervalo de confiança passando pelo 1).
Em relação às variáveis de histórico obstétrico, os grupos também dotaram homogêneos (p > 0,05 e IC da RP passando pelo valor 1). No entanto a gemelaridade ocorreu em dois casos, sendo 1 dentre os partos-pré-termo e 1 a termo. Isso fez com que a razão de prevalência fosse de 5,2 com IC de 1,2 a 22,5 – significativo, mostrando que a gemelaridade aumenta em 5,2 a chance de em relação a não ter gemelaridade. Como só houve duas pacientes com gemelaridade, não foi possível o ajuste pela mesma, pois seria necessário ao menos 2 em cada tipo de parto. Já com relação aos tipos de parto observou-se maior número de partos vaginais no grupo PAT (97,6%) e maior número de cesáreas no grupo PPT (13,0%). Estes dados estão descritos na Tabela 1.